26.7.05

Accidentally in love

Sexta feira quente de inverno, a tarde caminhava tranqüila para noite e Renata, após cumprir todas as tarefas da semana, dirigia-se tão somente para casa. O trabalho havia sido entregue no prazo certo e isso era o que mais importava.

- Missão cumprida e bem feita - dizia para os botões da blusa.

O trânsito fluía bem para o horário do rush. Anormal e estranho pelo dia que era, mas por que reclamar? Até agora, tudo estava indo como tinha de ser. Perfeito.

- Quem sabe o universo não está colaborando para que eu chegue mais rápido hoje? Meu reino por um banho e pernas para o ar. Eu mereço e é o que mais quero agora – pensava alto.

Bastavam as últimas duas semanas em que tudo havia sido difícil. Aquela reportagem lhe deixara com alguns neurônios a menos: horas e horas de pesquisas com afinco, entrevistas com as fontes e por último, a finalização do texto.

- UFA! Vou pedir ao chefe duas semanas de descanso – sonhava acordada.

Distraída dirigia, ziguezagueava com o carro, cantarolando alto, “Accidentally in love”, chamando atenção de quem passava e continuava: “Come on, come on, turn a little faster, come on, come on, the world will follow after, come on, come on, cause everybody's after love.

Um pouco antes, porém, Carlos também desejava chegar cedo em casa. Encontrava-se saturado e assim como ela, só queria esquecer a fatídica pesada semana com suas toneladas de audiências e quilos de papéis e processos jurídicos para resolver.

- Não acredito, ainda vai dar pra correr na praia – também conversava com o volante.

Tudo conspirava para a chegada daquele momento e foi ali, no meio do trânsito, que eles se cruzaram a quase 100 Km por hora.

Ao passar por ela, aquele jeito de dirigir e a forma como cantava lhe chamou a atenção:
- Parece que é policial e está contente. Uma policial contente – comentou sozinho, achando a cena engraçada.

Não resistiu, aparelhou o carro com o dela, abaixou o vidro e sorriu. Simpaticamente, Renata devolveu-lhe o sorriso e ao mesmo tempo acelerou com o carro.

Foi o bastante para que uma excitação e perseguição começassem entre eles. Carlos a seguiu, ora ele a ultrapassava, ora ela ia à frente por dois ou três carros. E assim foi, por um bom trecho de estrada livre em que viraram duas crianças inconseqüentes e perigosas ao volante.

Num momento de precisão e maluquice, eles diminuem a velocidade e Carlos acerta estrategicamente o telefone celular dentro do carro dela, ligando de seu outro aparelho.
- Quem é mais doido, eu ou você? – Renata perguntou.
- É você, claro! – ele responde.

Sem se darem conta de todo aquele encontro inusitado, como fundo musical da conversa, a canção os seguia e terminava baixinho: So I said I'm a snowball running, running down into the spring that's coming all this love, melting under blue skies, belting out sunlight shimmering love... Accidentally in love, Accidentally in love, Accidentally in love...

E conversaram, conversaram e conversaram. Eles pararam no acostamento, ela devolveu-lhe o celular e se conheceram normalmente como todos os seres humanos civilizados fazem.

Acho que estão conversando até hoje e não mais se desgrudaram.

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